MANUEL DA FONSECA
(Santiago
do Cacém, Portugal, 1911 — Lisboa, 1993)
Poeta,
contista, romancista
***
Integrado de início na
corrente neo-realista, enveredou depois para um regionalismo expresso
simbolicamente através da vegetação castigada e das pessoas sem fortuna nem
esperança.
in” Portugal Século XX”
***
Romance do
Terceiro-Oficial de Finanças
Ah!
as coisas incríveis que eu te contava
assim
misturadas com luas e estrelas
e a voz vagarosa como o andar da noite!
As
coisas incríveis que eu te contava
e
me deixavam hirto de surpresa
na
solidão da vila quieta!...
Que
eu vinha alta noite
como
quem vem de longe
e
sabe o segredo dos grandes silêncios
-
os meus braços no jeito de pedir
e
os meus olhos pedindo
o corpo que tu mal debruçavas da varanda!...
(As
coisas incríveis eu só as contava
depois
de as ouvir do teu corpo, da noite
e
da estrela, por cima dos teus cabelos.
Aquela
estrela que parecia de propósito para enfeitar os teus cabelos
quando eu ia namorar-te...)
Mas
tudo isso, que era tudo para nós,
não
era nada da vida!...
Da
vida é isto que a vida faz.
Ah!
sim, isto que a vida faz!...
-
isto de tu seres a esposa séria e triste
de um terceiro-oficial de finanças da Câmara
Municipal!...
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