CANTO
CONTRA A ESPERANÇA
(do poema inédito A
Mulher de luto)
Houve
outrora, um palácio, hoje em ruínas,
fundado
numa rocha, à beira mar…
donde
se avistam lívidas colinas,
e
se ouve o vento nos pinhais, pregar.
Houve outrora, um palácio, hoje em ruínas.
Nesse
triste palácio inabitável,
as
janelas sem vidros, contra os ventos,
batem
de noite, em côro miserável,
lembrando
gritos, uivos e lamentos.
Nesse triste palácio inabitável.
Só
resta uma varanda solitária,
onde
medra uma flor que bate o norte,
sacudida
da chuva funerária,
lavada
de um luar branco de morte.
Só resta uma varanda solitária.
Como
nessa varanda apodrecida,
em
minha alma uma flor também vegeta,
toda
a noite dos ventos sacudida,
inteira,
humilde, lírica. Secreta.
Como nessa varanda apodrecida.
Vai
tu, ó minha dor, a esse palácio!
e
arranca-lhe essa flor… Vai sem tardança!
como
um guerreiro audaz do velho Lacio
arranca-a
e calca-a aos pés – porque é a Esperança
Vai tu, ó minha dor, a esse palácio!
Gomes Leal -
poeta e crítico literário (Lisboa, Portugal,
1848 – 1921).
Imagem: pintura de Gustav Klimt (Áustria,
1862-1918).
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