quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Poema de MANUEL DA FONSECA dedicado a MANUELA PORTO





Poema de MANUEL DA FONSECA dedicado a MANUELA PORTO

I


Como búzio que ecoa
rumores do mar distante,
nossa saudade guarda
a tua voz ausente.

Na névoa da miragem
que as lágrimas estremece,
velado como em sonhos
teu rosto transparece.

E teus olhos, Senhora,
estrelas que a alva esfria,
cintilam indecisos
entre a noite e o dia.

Como quem escuta um búzio
- na muda madrugada
nossa saudade escuta
tua voz apagada.
             
  II

Imóvel e deslumbrada
mágico sonho sonhava.
Longínqua, feita de nada,
a erguida presença alada
no ar lavado flutuava.

Absorto, vogando espaços,
seu olhar claro e profundo
vinha, por ocultos traços,
através de altos terraços,
debruçar-se sobre o Mundo.

Com gestos lentos abria
aérea graça gentil.
Voz onde a vida fluía
na alteada melodia
da nitidez do perfil.

(Ora quando despertava
das harmonias extremas,
se o mundo a interrogava,
a cabeça reclinava,
e respondia : Sei poemas.)



MANUEL DA FONSECA, poeta e escritor (Santiago do Cacém, Portugal, 1911 - Lisboa, 1993).

MANUELA PORTO, escritora, actriz e declamadora (Lisboa, Portugal, 1908-1950).









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