WANDA
RAMOS
(Dundo, Angola, 1948 - Lisboa, Portugal,1998)
Poetisa, ficcionista e tradutora
A sua estreia literária deu-se
com o livro de poemas Nas Coxas do Tempo,
seguido por E Contudo Cantar Sempre e
Poemas-com-Sentidos, obras em que o
tema central é o tempo. Este tema tem prevalecido, também, ao longo da sua
caminhada ficcional.
O seu primeiro romance, Percursos (Do Luachimo ao Luena), galardoado com o prémio da
Associação Portuguesa de Escritores, consagrou a autora como um dos nomes mais
importantes da ficção portuguesa dos últimos anos. Construído a partir das suas
memórias pessoais, recorda a sociedade colonial e dá a conhecer a sua visão da
guerra colonial, sob um ponto de vista feminino.
in “Escritas” (excertos)
E
correram os rios
Correram
como rios as palavras
altas
e soltas correram os rios na gente
rios
de lava Lisboa inflamada acorrendo fremente
nos
dias eu se abriram vinda das faldas vertida
dos
dormitórios da cintura fumegante e mecanizada
Lisboa
livre acorreu
enxameadas
as veias avenida da liberdade
rossio
terreiro do paço Belém
–
e além na outra banda absurdo o cristo:
braços
em cruz impotente –
e
correndo os rios cada vez mais latos
até
o súbito despedaçar-se da seda contra a amurada
afundadas
as olheiras da vigília entornadas
as
falas em busca do nexo – e achámos esta sorte
o
sangue agitado o tempo:
uníssono
o nosso grito
escancarado
em cada rua
em
passo de estar alerta
uníssono
ressoou porém mais fundo.
E
assim nos pergunto que águas nos lavaram tão de dentro
e
levaram alamedas da liberdade acima
que rios tão feitos de luta e punhos? alegria?
Publicação nº 1253
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