A águia e a truta
Uma rainha de Aragão foi sentenciada à morte pelo rei
seu marido, em virtude de uma intriga de criados. Sabedora da sorte que a
esperava, disfarçou-se e fugiu. Foi-lhe no encalço o rei, que junto ao Rio
Minho a teria apanhado, se a rainha não houvesse pedido aos barqueiros que o
demorassem o tempo suficiente para ela se acolher a certo castelo.
Em virtude da lealdade dos barqueiros, a rainha
conseguiu refugiar-se no castelo. Veio o rei pôr-lhe cerco, e pela fome e pela
sede empreendeu rendê-la.
Ela, porém, descobriu ali uma fonte que a alimentava
de água pura, e, quinze dias passados, veio sobre os rochedos pousar uma águia,
que trazia no bico uma truta, assustada talvez pela presença da rainha ou de
alguma pessoa do seu séquito.
Em vez de se aproveitar do saboroso peixe, a rainha
mandou-o de presente ao rei, que a cercava, e tinha o seu acampamento no lugar
onde hoje é Trute.
O rei, persuadido de que o braço divino a amparava, levantou
o cerco, perdoando-lhe, contrito, as supostas faltas. Não quis a rainha
acompanhá-lo depois, e por estes lugares terminou a vida em devotos exercícios
e penitências austeras.
José Leite de
Vasconcelos, in “Lendas Portuguesas”.
Imagem: pintura de José Dominguez Alvarez (Porto, Portugal, 1906 – 1942).
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